Machismo infantil existe, e precisa ser discutido

Machismo infantil existe, e precisa ser discutido

Por: Marcia Belmiro | Crianças | 21 de fevereiro de 2020

Quando um casal espera um bebê, toda a família fica em polvorosa até que se descubra o sexo da criança, “para poder comprar o enxoval” nas cores e padrões corretos (rosa, com bolinhas e bichinhos fofos para as meninas; azul, com listras e animais selvagens para os meninos). Assim, uma pessoa que ainda nem nasceu já está inserida na cultura machista constituída em nossa sociedade.

Crianças bem pequenas são apresentadas ao machismo em suas mais variadas formas: meninos ganham carrinhos, bonecos de super-heróis musculosos e espadas; meninas recebem bonecas, eletrodomésticos de plástico rosa e maquiagem infantil. Meninos ouvem que não podem chorar e que devem ser corajosos; meninas são estimuladas a ser boazinhas, estar sempre de cabelo penteado e limpas – inclusive na praia e na areia da pracinha.

Ao longo de toda a infância, qualquer objeto que a pessoa necessite estará alocado em um departamento pré-determinado: brinquedos, roupas, toalhas, boias de braço, copos, pratos, até livros – a lista é infinita. A pergunta que as mães ouvem dos vendedores é sempre a mesma: “É para menino ou menina?”


Tarefas domésticas

A Plan Brasil, ONG que defende os direitos de crianças e adolescentes, divulgou em 2015 uma pesquisa realizada com meninas e meninos de 6 a 14 anos em todas as regiões do Brasil sobre a disparidade na distribuição das tarefas domésticas. Enquanto 81,4% das meninas arrumam sua cama, apenas 11,6% dos meninos realizam essa tarefa. Entre as meninas, 76,8% lavam a louça e 65,6% limpam a casa. Já entre os meninos, 12,5% lavam a louça e 11,4% limpam a casa. Outra tarefa predominantemente destinada às meninas é a de cuidar dos seus irmãos: 34,6% são responsáveis por essa função, contra 10% dos meninos.

Assim, não é de admirar que o machismo se perpetue em todas as esferas da vida. Alguns pais e mães se assustam ao perceber uma atitude sexista em seus filhos e se questionam como isso pôde ocorrer, já que em casa isso não é ensinado. Infelizmente esse é um aprendizado que não precisa ser formalmente passado adiante.

As crianças, com sua sensibilidade aguçada, percebem que, por exemplo, a maioria dos cuidadores são mulheres, mas a maioria dos cientistas são homens. A maioria das cozinheiras são mulheres, mas a maioria dos chefs de cozinha são homens. Sua mãe trabalha mais horas (dentro e fora de casa), mas seu pai é chamado de chefe da família. Dessa forma, vão se adequando “naturalmente” – embora esse processo nada tenha de natural – ao papel que lhes cabe na sociedade.

O que fazer para quebrar o ciclo do machismo entre nossas crianças, desconstruindo preconceitos, propiciando que elas possam formar uma nova sociedade, liberta definitivamente de truculências contra a mulher num futuro (esperamos) próximo?

  1. Conversar

Todos os dias, em qualquer ambiente, seus filhos se deparam com o machismo. Não despreze as pequenas situações; ao contrário, aproveite-as. É no cotidiano que as crianças vão formando seus conceitos (e preconceitos). Ao assistir a um simples filme infantil é possível falar sobre violência contra a mulher, desigualdade no mercado de trabalho, relacionamentos abusivos etc.

  1. Dar o exemplo

Nenhuma conversa é tão efetiva para formar bons cidadãos quanto os exemplos que os adultos cuidadores (em geral pai e mãe) dão. Em casa, divida as tarefas igualmente, com responsabilidades para todos. Isso inclui não só limpar a casa, cozinhar e lavar a louça. As funções administrativas também podem ser divididas: quem faz a lista de compras do mercado, quem cuida da carteira de vacinação das crianças, quem é responsável por providenciar lanche e uniforme limpo para a escola… As crianças (independentemente do sexo) também podem colaborar na manutenção da ordem e limpeza da casa, de acordo com a idade, fazendo assim um treino positivo para serem capazes de cuidar de si mesmas e de seu lar quando adultas.

  1. Informar-se

O machismo é tão arraigado que muitas vezes não percebemos que ele está ali. Atualmente há livros, filmes e páginas na internet dedicadas a combater o machismo na infância. Confira algumas sugestões aqui:

Livro Para educar crianças feministas, de Chimamanda Ngozi Adichie

Livro A pior princesa do mundo, de Anna Kemp e Sara Ogilvie

Documentário Repense o elogio. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=PhLFszSFr3E

Documentário The Mask You Live In. Disponível em: https://www.netflix.com/br/title/80076159

Página no Facebook “Já falou para seu menino hoje?”. Disponível em: https://www.facebook.com/jafalouparaseumenino

Fonte:

Pesquisa “Por ser menina no Brasil: Crescendo entre direitos e violências”. Disponível em: http://primeirainfancia.org.br/wp-content/uploads/2015/03/1-por_ser_menina_resumoexecutivo2014.pdf

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