Por: Marcia Belmiro | Educação | 20 de agosto de 2020
No artigo de hoje, vamos tratar do luto em sala de aula no pós-pandemia. Como ele se manifesta? Como os professores podem lidar com essa questão?
Em primeiro lugar, é importante deixar claro que essa condição afeta a todos, crianças e adultos, independentemente de terem perdido entes queridos vítimas de coronavírus. No artigo “Catástrofe, luto e esperança: o trabalho psicanalítico na pandemia de COVID-19”, Verztman e Romão-Dias citam Freud ao definir o luto como “uma forma de sofrimento caracterizada por um rearranjo de nossas relações com o mundo e com nós mesmos diante da subtração de um objeto ao qual estivemos, em parte significativa de nossa existência, ligados”.
A seguir, os pesquisadores continuam: “Tal sofrimento também diz respeito às perdas de entes queridos e à ausência de rituais de encontro e de consolo postas à disposição, até recentemente, pela nossa cultura para fazer frente à morte.”
A psicóloga Cristiane Uchôa Pinheiro – em reunião da Comissão Extraordinária de Defesa dos Direitos da Criança, do Adolescente e da Juventude da Câmara Municipal de São Paulo, em maio (transmitida on-line) – amplia o conceito de luto, como algo não necessariamente relacionado à morte de fato: “A organização da rotina de crianças e adolescentes foi tirada: a convivência escolar, as visitas aos amigos, saídas para brincar, viagens. Luto é sobre perdas concretas e também simbólicas.”
O luto no comportamento infantil
Diferentemente do adulto, que consegue expressar em palavras o que sente e pensa, de modo a elaborar suas angústias, “a criança muitas vezes não entende o que está acontecendo nem sabe expressar o que sente, então manifesta que está passando por um processo muito difícil no comportamento (com agressividade, choro, alterações de sono), e pode até ter queixas físicas, como dor de cabeça e de barriga, vômito, febre”, relata Cristiane.
A psicóloga alerta para uma atitude muito comum entre os adultos: “Quando estamos em casa com a TV ligada, as crianças assistem ao noticiário, que fala sobre número de mortes no Brasil e no mundo. Elas têm vários questionamentos, e não discutimos isso com elas. Como essas crianças recebem isso [as informações sobre a pandemia]? O luto e a morte não são temas sobre os quais falamos normalmente. E hoje é difícil falar com as crianças e adolescentes sobre isso porque o tema é complexo, mas também porque todos estamos sendo afetados.”
O luto sempre causa trauma?
“A perda por si só não é danosa ao indivíduo. Mas quando ela não é vivida e elaborada, pode acarretar prejuízos pelo resto da vida. Não adianta fingir que está tudo bem, nem ficar só reclamando sem refletir sobre o processo. Para superar o luto, é preciso vivê-lo”, pondera Marcia Belmiro.
Como lidar?
Cristiane lembra os adultos cuidadores sobre sua responsabilidade no acolhimento ao luto das crianças e adolescentes. A psicóloga orienta que os pais e professores sempre respondam as perguntas dos filhos e alunos com honestidade, demonstrando também o que sentem. Quando as questões não partirem do jovem, a profissional sugere que os adultos perguntem claramente o que este sente e pensa, abrindo espaço para uma conversa necessária.