O que as crianças pensam no cantinho do pensamento?

O que as crianças pensam no cantinho do pensamento?

Por: Marcia Belmiro | Crianças | 12 de dezembro de 2019

Imagine a seguinte situação: Você entrega um relatório ruim a seu chefe. Ele olha o material e diz: “Que horror! Você trabalha mal, vai para a sua mesa pensar.” O que você pensa nesse momento? Provavelmente: a) que ele é injusto, porque você já fez ótimos relatórios; b) que ele é insensível, pois não entende a situação difícil que você está passando em casa; c) que ele está te perseguindo, porque seu colega sempre faz relatórios piores e ele nunca reclama. Você não deseja fazer um trabalho melhor da próxima vez, só mostrar que seu chefe está errado.

Trazendo essa situação para a realidade familiar: Seu filho bateu novamente no amiguinho da escola. Você já tinha dito mil vezes para ele não fazer isso, e ele fez de novo. Você não sabe mais como resolver a situação, e já imagina que seu filho vai crescer e continuar a agredir as pessoas sem qualquer controle na vida adulta. Na sequência, se sente mal por não estar obtendo os resultados que esperava, e deduz que não sabe educar o próprio filho, e aí bate a culpa.

Como resolver isso? “Vai para o seu quarto pensar!”

Lembrando que:

  • A criança ainda não tem desenvolvimento neurológico suficiente para alcançar o raciocínio abstrato de pensar sobre algo ou analisar uma situação sozinho;
  • Seu cérebro ainda é predominantemente límbico, ou seja, ele responde às situações com sentimentos, não com pensamentos;
  • Ele ainda não tem critérios para definir novas ações por si só.

Dito isso, o que será que uma criança pensa no cantinho do pensamento? A resposta é: nada. Nesse momento, a criança só sente: desamparo, desamor, raiva, sentimento de ter sido injustiçada, vontade de se vingar. Enquanto está de castigo, inundada por esses sentimentos ruins, a criança não consegue focar em resolver o problema, reparar seu erro ou em como agir diferente da próxima vez.

E mais: entende que só é amada quando obedece, quando faz o que se espera dela, e que precisa passar pelos momentos difíceis sozinha, isolada. Na verdade, é quando se comporta mal que a criança precisa se sentir mais acolhida, pois é com a orientação afetuosa dos pais que poderá – aí sim – pensar sobre o que fez de errado e como planejar novas ações.

Alguém que assistiu a um programa de TV com uma babá que dava dicas de como resolver os problemas de todas as famílias pode dizer: “Mas o cantinho do pensamento funciona.” A curto prazo realmente funciona, no sentido de que o comportamento não desejado é interrompido imediatamente. Mas, no fim das contas, não se trata de um aprendizado, mas de uma espécie de adestramento. A médio prazo, vai se tornando necessário usar punições – sim, o cantinho da disciplina é uma punição – cada vez mais severas, sem resultado real. E, a longo prazo, gera afastamento emocional entre pais e filhos.

Esse tipo de atitude é apenas uma manifestação do ego dos pais – nas entrelinhas, significa que a criança precisa aprender “quem manda aqui”. É realmente esse tipo de reação que você quer construir com a pessoa mais importante da sua vida?

E agora, o que se pode fazer em alternativa ao cantinho do pensamento? Confira abaixo algumas orientações:

– Ninguém consegue tomar boas decisões no calor do momento. Explique a seu filho que está muito brava e não tem condições de conversar agora, que precisa de alguns minutos para se acalmar. Saia, beba água, lave o rosto, respire fundo, e depois retome o assunto com mais tranquilidade. É provável que seu filho também passe a fazer isso, pedindo um tempo para se acalmar antes de conversar.

– Nessas situações, um “cantinho da calma” pode ajudar muito. Bem diferente do cantinho da disciplina, o cantinho da calma é um lugar criado pela criança, com objetos que a fazem se sentir bem: papéis e lápis de cor, bonecos fofinhos, almofadas confortáveis para sentar. Lá ele pode brincar um pouco e esfriar a cabeça até se sentir melhor.

– Quando vocês dois estiverem mais calmos, tente ouvir o que seu filho tem a dizer, sem julgá-lo, mas mostrando a ele sua responsabilidade pelos próprios atos, com frases como “o que será que seu amigo sentiu quando você bateu nele?”. Nesse caso, talvez pedir desculpas ao colega que apanhou seja o menos importante, pois muitas vezes é apenas um ato mecânico, sem sentido real. Em vez de castigá-lo, experimente pensarem juntos em uma consequência direta do ato errado, algo que repare o que ele fez, como cuidar do machucado do amigo da próxima vez (ou algo que vocês definam juntos).

                      

Matérias Relacionadas

Nossas crianças estão mesmo mais hiperativas? Diagnósticos de TDAH sobem todos os anos, no Brasil e no mundo
Quais são as principais demandas ao procurar um KidCoach?
O que aprendi de mais valioso com meu pai