Por: Marcia Belmiro | Crianças | 28 de novembro de 2019
Se seu filho tem 2 anos, provavelmente você já percebeu que o comportamento dele mudou um pouco ultimamente. “Um pouco!?”, alguém poderia perguntar, diante de reações como choro incessante e gritos a plenos pulmões por motivos como a hora do banho, a hora de trocar a fralda, ou o irmão que comeu a metade da banana que ele disse que não queria mais. Nesse momento mães e pais ouvem muitos palpites: é birra, manha, pirraça, malcriação, piti, show, escândalo, drama, chilique – inúmeros nomes para dizer que chegaram, enfim, os terríveis 2 anos. Ou, como são mais conhecidos nos grupos de mães, o terrible two.
Em primeiro lugar, fuja dos rótulos. Terrible two não é apenas uma expressão, é o prenúncio de uma sina. E, se acreditarmos que não existe nada a ser feito, certamente vai haver mais angústia – para pais e filhos. Se, por outro lado, entendermos que este é um momento natural da evolução física e psíquica do ser humano, é possível que haja mais tranquilidade para toda a família.
Aprendizado intenso, emoções intensas
A criança de 2 anos é uma exploradora, uma desbravadora, muito ativa e curiosa. É uma fase de aprendizado intenso, uma verdadeira explosão de conexões neuronais. É também uma fase de afirmar sua individualidade, de se saber distinto da mãe. Há aí um grande desejo de controle – mas por não haver ainda condições para tal, a bola cai, o carrinho não vai para onde a criança quer. E aí ela descobre a frustração, com a qual ainda não sabe lidar.
Acontece, então, uma crise emocional temporária, uma espécie de “curto-circuito” hormonal. O neocórtex, responsável pelos pensamentos, ainda é muito pouco desenvolvido. Já o sistema límbico, atrelado aos sentimentos e totalmente formado desde o nascimento, toma conta da cena. Resultado: há um verdadeiro encharcamento de hormônios, gerando total descontrole.
Nesse momento, a atitude dos pais é fundamental. Não se resolve descontrole com mais descontrole. Quando os pais censuram o filho, passam a mensagem de que ter sentimentos ruins não é permitido – isso vai fazer com que a criança não se sinta à vontade para demonstrar sua angústia. A birra não é falha de caráter, falta de educação ou de “pulso firme” – a criança é essencialmente boa e cooperativa. Provavelmente ela só tem uma necessidade não atendida e não sabe como expressar isso.
Quando achamos que tudo é “culpa” do terrible two, tiramos o foco da criança, do que ela sente e precisa.
Será manipulação?
Às vezes dizemos: “Ele só quer chamar atenção.” Essa frase pode ser verdadeira, mas aí, em vez de nos voltarmos contra nossos filhos supostamente manipuladores, cabe uma reflexão: Por que ele acha que precisa chamar atenção? Por que aprendeu que fazendo coisas ruins consegue o que quer? Não estarei reforçando positivamente um comportamento indesejado – o que só vai fazer com que ele seja mais frequente?
Veja aqui nossas orientações para que os 2 anos de seu filho sejam mais wonderful two do que terrible two:
– Não sinta vergonha da situação nem das pessoas em volta. Os olhares de recriminação dizem mais dos outros do que de você ou da maneira como cria seu filho. Analise se você quer a aprovação das pessoas, o dito “filho-modelo”, ou uma criança emocionalmente saudável.
– Dar limites é fundamental, mas sem violência. Não use castigos, punições ou ameaças.
– Não adianta dizer “fique calmo”, a criança pequena ainda não sabe fazer isso sozinha. Ensine ela a respirar fundo (peça que coloque as mãos na barriga para senti-la descer e subir).
– Explique que, se quer atenção, não precisa pedir dessa forma. Pode dizer que quer um abraço, ou brincar juntos.
– Ajude a criança a expressar o que pensa e sente, acolhendo-a e nomeando seus sentimentos.
– Não desmereça o motivo só porque não faz sentido para você, seja empático e diga algo como “entendo que não poder brincar com o cavalo agora é frustrante”.
– Distraia a criança com opções pré-definidas: você prefere levantar do chão e ler uma história ou brincar com os bonecos?
– Avalie se pode haver um motivo externo, como cansaço, sono ou fome.
– Se possível, tenha uma rotina de exercícios, de preferência ao ar livre, para a criança gastar energia. Não precisam ser atividades fixas nem dirigidas, também é importante ter tempo de ócio e livre brincar.
– Não caia na tentação de ceder apenas para cessar a birra. Se há a clareza da importância do não, mantenha sua decisão.
– Se você perdeu o controle, peça desculpas. Assim seu filho vai aprender que o ser humano falha, mas que a violência não é uma forma aceitável de resolver problemas. E não se renda à culpa. A culpa é um sentimento inútil, sempre.