Por: Marcia Belmiro | Crianças | 25 de outubro de 2019
A criança não quer comer. Os pais ligam um desenho no tablet e, em poucos minutos, o prato está limpo. Esta cena provavelmente é familiar, e é possível que você mesma já tenha feito algo semelhante com seu filho. Não estamos aqui para julgá-la, apenas para explicar como acontece esse aparente “milagre” e os riscos escondidos em uma situação que cremos ser tão banal.
A pediatra e KidCoach Jane Rezende realizou um webinário com Marcia Belmiro, criadora do método KidCoaching, e faz uma análise aprofundada sobre como o uso precoce e sem limites de eletrônicos pode causar danos ao desenvolvimento infantil. Veja alguns trechos dessa conversa a seguir:
Como as telas interferem na atividade cerebral?
“A luminosidade do aparelho, ao entrar nos olhos, independentemente da idade da pessoa, dá um estímulo cerebral, mobilizando hormônio do crescimento, cortisol [hormônio do estresse], dopamina [hormônio do prazer] e também a melatonina [hormônio do sono]. Há um modificação no relógio biológico. Quando essa luz é introduzida precocemente [a OMS orienta que crianças até 2 anos não tenham qualquer contato com telas], interfere nos neurônios e na visão da criança, que tem o cérebro mais moldável. Essa luz interfere no humor, no sono, na visão, nos hormônios ligados ao apetite, especialmente a leptina [que atua regulando a ingestão de alimentos]. O prejuízo pode ser permanente.”
Os eletrônicos na segunda infância
“A criança de 5 a 12 anos nem sempre está acompanhada dos pais. Ela passa por fases de obsessão, de só querer o mesmo jogo, e vai satisfazendo sua obsessão com esse prazer. Isso aumenta a dopamina. A cada nova fase do jogo, há mais liberação de dopamina, e a criança vai precisando de cada vez mais, um comportamento parecido com o do vício em drogas. Como a infância é uma fase de imaturidade neurológica, pode haver uma reorganização neuronal, ou seja, a criança aprender de forma errada. [No jogo,] eles se acostumam a ter tudo facilmente, na vida real não é assim. Chega um momento que o que era prazer passa a ser estresse, aí há aumento no cortisol. Quando isso acontece, as crianças antecipam vivências com hormônios que em teoria seu cérebro não está adaptado para ter.”
Dificuldade de concentração
“A região frontal [do cérebro], de pensamentos e raciocínio, começa a ser lesada, atrapalhando o foco das crianças. Uma das ações que derivam disso é a falta de capacidade cerebral de manter o foco. Concomitantemente ao cortisol vem a adrenalina, e a criança tem aumento da frequência cardíaca. E se ela não consegue passar de fase ou vencer o amigo, isso gera ansiedade. Quando aumenta o cortisol, diminuem os hormônios que dão sensação de paz e plenitude.”
Outros danos relacionados
“Além da falta de atenção, pode ocorrer irritação, dificuldades de relacionamento, de aprendizagem, e por consequência autoestima baixa. Há alteração também dos hormônios do centro da fome, aumentando a chance de [a criança] desenvolver obesidade. Que não advém só de ficar parado, comendo, sem fazer atividade física. Isso acontece pelas alterações de neurotransmissores.”
Uma vida de “zero tela”, como defendem alguns estudiosos, pode ser difícil demais na nossa realidade atual – de jornada dupla ou até tripla, correria e mediatização da vida de modo geral. Além disso, há certamente desenhos animados, filmes e aplicativos de qualidade que ensinam e divertem as crianças. O objetivo deste texto é dar informações acerca dos mecanismos psíquicos de ação dos eletrônicos, para que a partir daí cada família possa definir seus limites e combinados para o uso dos equipamentos, de modo a contribuir para a saúde física e mental de crianças e adultos.
Se quiser assistir ao webinário com Jane Rezende e Marcia Belmiro completo, clique aqui: https://youtu.be/5PO5VTXHBLs